Sobre você: era pra ser um poema, mas virou turbilhão
Era pra você ser uma crônica escrita num domingo de manhã, com cheiro de café recém-coado e gosto de quem dormiu tudo o que precisava. Era pra você ser um poema escrito na sexta a noite depois do expediente, com o peso das costas e o suor do dia que insiste em nunca acabar. Era pra você ser só um dos textos que eu escrevo por aí e que parecem ter seis páginas de extensão e me obrigam a cortar até caber em mil e quinhentos caracteres. Era pra você ser um texto que eu escrevi no meu diário e nunca tirei de lá, porque falava muito profundamente sobre nós sem dizer nada sobre coisa nenhuma. Era pra você ser só uma frase que eu rabisquei no canto do caderno de tarefas e nunca tirei de lá.
Mas aí você veio como uma avalanche e tomou conta da coisa toda, se tornou uma odisseia contemporânea de doze volumes e eu não consigo mais ver fim. Você veio fazendo o papel de tsunami que prometeu que faria e estraçalhou tudo o que viu pela frente, transformou meus poemas em cobertor e os usou pra se aquecer nos dias em que o gelo do mundo tomava conta de dentro de você. Você fez exatamente o que prometeu e não pensou duas vezes antes de me transformar na palavra mais dita do seu dia, no canto que nunca cessa, no livro de cabeceira que sempre está ao lado, que é indicado pra todo mundo, que todo mundo precisa ler, mas que faz uma década e meia que serve de apoio pros óculos que você coloca na cabeceira antes de dormir.
Era pra você ser um poema, mas você veio como um turbilhão e eu já não sei mais usar as palavras pra outra coisa que não seja te contar que era pra você ser um monte de coisa que você avisou que não seria — e eu insisti em não acreditar.